Borrasca registra (e ultrapassa) o tempo onde fortes ventos e uma chuva violenta tomaram conta do país e da vida íntima de todos que sofreram a tormenta. Os 36 poemas de seu novo livro traduzem a dimensão dessa tempestade. Nele, Rita Santana se utiliza de uma linguagem clara e fecunda como a água, construindo versos embebidos de música, ousadia e rigor formal. Não por acaso, seu ritmo é polifônico, seus temas se entrelaçam tanto na urgência quanto no descanso da luta.
Borrasca é uma declaração de amor à Arte e à vida. Há poemas dedicados a cineastas, atores, livros, autoras que nos reconduzem às obras originais e nos guiam a uma terceira margem, a uma possibilidade de ressignificação ou consolidação de sentimentos, de leituras.
Rita Santana nos surpreender com seus novos poemas, onde evoca memórias que tanto podem ser autobiográficas quanto imaginárias. Dedica-se à construção de cada poema, como se fossem quadros para uma exposição e demonstra completo domínio do uso de linguagem, desenvolvendo-se com fluidez, elegância e belas surpresas.
Ao retratar o cotidiano, Rita demonstra um olhar apaixonado e feminino quanto à sua visão de mundo. Apesar disso, extrai dele lirismo, como vemos no seguinte trecho: “”Assim sou eu: a que envelhece / a que pende sobre o nordeste dos sentidos. / Aquela que sobre os telhados, observa sua vinda.”
É sem dúvidas uma obra conduzida pelas mãos de uma mulher cujo desafio é denunciar acometimentos e transformações como a menopausa, a solidão, a política – sem abrir mão da condição de poeta. O resultado é um trabalho maduro que foge ao panfleto pois o livro se ergue em nossos sentidos com extrema delicadeza, força, metáforas, metalinguagem, evocações, provocações. Aqui a poesia é poesia, ou seja, é a vida, a nossa vida, recortada em forma altamente lírica, filosófica, literária. Portanto, eleva-se dentro de nós em inquietude, comoção e sentido de eternidade.
“Borrasca” é um daqueles raros livros onde a literatura não rompe seu contato com a fragilidade da condição humana.